Enquanto comentava comigo mesmo que Deus havia sido clemente com ela, uma vez que não permitira que chegasse até o castigo comum, fazendo que morresse no auge do luxo e da beleza, antes da chegada velhice, que é na verdade a primeira morte das cortesãs.
De fato, o que há de mais triste do que ver a velhice do vício, sobretudo na mulher? Trata-se de uma velhice que não tem a mínima dignidade e não inspira nenhum interesse. O arrependimento eterno, não devido ao mau caminho percorrido, mas sim pelos cálculos malfeitos e o dinheiro mal-empregado, é um dos sentimentos mais tristes que pode atingir uma cortesã envelhecida. Conheci uma velha senhora que nada mais tinha do passado além de uma filha quase tão bela como havia sido a mãe, segundo afirmavam seus contemporâneos. Essa moça, a quem a mãe jamais dissera "Você é minha filha" a não ser no momento em que precisou dela para amparar sua velhice como ela a amparara na infância, chamava-se Louise, e, obedecendo à mãe, entregava-se sem boa vontade, sem paixão e sem prazer do mesmo modo que desempenharia qualquer profissão, caso houvesse aprendido uma.
A convivência constante com o deboche, um deboche precoce alimentado continuamente pelo estado doentio da jovem, havia apagado nela a compreensão para o mal e o bem que talvez Deus lhe houvesse concedido mas que ninguém se dera ao trabalho de desenvolver.
Nunca vou me esquecer dessa moça que passava pelos bulevares todos os dias à mesma hora. A mãe estava sempre ao lado dela, tão assiduamente quanto uma verdadeira mãe acompanharia a verdadeira filha. Eu era muito jovem naquela época e disposto a aceitar a moral fácil do meu século. No entanto lembro-me de que aquela vigilância escandalosa inspirava-me desprezo e asco.
Acrescente-se a esses fatos que jamais o rosto de nenhuma virgem espelhou sentimento de inocência e de sofrimento melancólico como o dela espelhava. Poderia dizer-se que era a imagem viva da Resignação.
Um dia, o rosto dessa jovem resplandeceu. No decorrer dos deboches que sua mãe programava, pareceu à pecadora que Deus lhe permitia uma felicidade. E por que, afinal de contas, Deus, que a fizera sem forças, iria deixá-la sem consolo sob o peso doloroso de sua vida? Então, naquele dia, ela percebeu que estava grávida, e o que ainda havia de casto na moça vibrou de alegria. A alma tem refúgios estranhos. Louise correu a contar à sua mãe a novidade que a fazia tão feliz. É vergonhoso dizê-lo, porém não estamos mencionando aqui a imoralidade por prazer; contamos um fato verdadeiro, que talvez fosse melhor calarmos se não acreditássemos que de vez em quando é preciso revelar o martírio dos seres que condenamos sem ouvi-los, que desprezamos sem julgá-los. É vergonhoso, eu dizia, mas a mãe respondeu à filha que já não tinham o suficiente para as duas e que não teriam o que bastasse para três, que crianças eram inúteis e que a gravidez significava tempo perdido.
No dia seguinte, uma parteira, que vamos definir apenas como amiga da mãe de Louise, que ficou alguns dias de cama e levantou-se mais pálida e mais fraca do que antes.
Três meses depois, um homem teve piedade dela e iniciou sua cura moral e física, porém o último choque havia sido muito violento e Louise morreu em decorrência do aborto que fizer.
A mãe dela ainda vive. como? Só Deus sabe.
Livro: A Dama das Camélias
Autor: Alexandre Dumas Filho